A busca de crianças e adolescentes por um lar definitivo foi interrompida pela pandemia do novo coronavírus. Para evitar a contaminação dentro dos espaços de acolhimento, as visitas foram canceladas. Mas alguns casos puderam ser acelerados e os menores já estão nas casas das famílias com as quais já tinham convivência.
As medidas para conter a pandemia chegaram também aos abrigos, onde crianças e adolescentes aguardam os trâmites judiciais, que ajudam a decider o destino deles. Assistentes sociais e psicólogos auxiliam na questão técnica e também os próprios candidatos que desejam ter um novo integrante na família.
Toda essa equipe multidisciplinar precisou se movimentar rapidamente para analisar os casos que estavam mais próximos da conclusão. Com laudos técnicos aprovados, o grupo propôs para as novas famílias que já recebessem as crianças para passar a quarentena.
Mas não foram apenas as novas famílias adotantes que ganharam uma nova companhia. Outra figura muito importante ajudou a diminuir a quantidade de menores nos abrigos: os padrinhos e madrinhas. Geralmente, são pessoas próximas com quem eles se sentem bem e de quem recebem respaldo psicológico e afetivo.
É o que explica o juiz da Vara da Infância de Guarulhos, na Grande São Paulo, Iberê Dias. “Havia uma preocupação de esvaziar tanto quanto fosse possível essa casa de acolhimento, que tem até 15 crianças e adolecentes, mas também possui técnicos e cuidadores entrando e saindo o tempo todo”, destaca.
Foi formada, então, uma força-tarefa entre as varas da infância para verificar quais processos já estavam em condições de concluir a ida das crianças ou para casa de padrinhos e madrinhas ou para quem já estava querendo adotar.
“Para isso acontecer, havia a necessidade de um estudo que embasasse a medida, que mostrasse que a criança estava suficientemente vinculada com os padrinhos ou os pais. E, nos processos em que já havia esse estudo, os juízes aceleraram para tirar essas crianças dos abrigos”, comemora Dias.
Mas o juíz reforça que a medida foi excepcional e não deve mudar o trâmite dos processos de adoção no futuro. “Em alguns casos, passou a valer a pena, mas por conta da situação que envolve a pandemia. Vale o risco nos casos em que faltava pouco para estas crianças irem em definitivo para suas novas casas”, aponta.
Sobre o retorno da medida excepcional, Iberê Dias é positivo: “Ainda está ocorrendo tudo bem, tudo transcorrendo normalmente. Mais de um mês de quarentena, valeu a pena”.
Dados Nacionais
Segundo o SNA (Sistema Nacional de Adoção), existem 5.017 crianças e adolescentes disponíveis para adoção. Mas a maiora delas já está vinculada a algum processo judicial, o que significa dizer que elas podem voltar para suas famílias originárias ou já está em estudo a adoção por uma nova família.
Ainda assim, outros 1.506 menores ainda aguardam um novo lar que possa recebê-los. Em primeiro lugar, está o estado o Rio Grande do Sul com 278 crianças disponíveis. Em segundo, está São Paulo com 268 menores. O terceiro estado com o maior número de crianças disponíveis é o Paraná, com 209.
A maioria dessas crianças dos três estados possui 9 anos ou mais, não possui nenhuma deficiência intelectual ou problema de saúde e grande parte não tem irmãos. As regiões Sul e Sudeste possuem, juntas, 1.099 menores disponíveis para adoção.
Ao mesmo tempo, o número de crianças adotadas desde 2019 quando o cadastro foi lançado é de 2.955 menores. As duas regiões, Sul e Sudeste, representam também os estados onde mais crianças foram adotadas. Em primeiro lugar está o Sul com 1.090 crianças que encontraram um lar. Depois, vem o Sudeste com 1.043 menores adotados.
No Nordeste, o número de crianças e adolescentes disponíveis para adoção é de 274 menores. Na região Norte, há 26, e, no Centro-Oeste, 107.
Processos paralisados
Apesar da boa notícia com os casos que foram “acelerados”, os demais que ainda dependiam de audiências, visitas e tempos de convivência para terem seguimento tiveram que ser totalmente paralisados para evitar a disseminação do coronavírus.
Durante o processo de adoção, a criança e os adotantes vão aumentando o tempo de convivência e, mesmo quando vão morar na casa nova, os menores ainda não estão adotados. A maioria dos casos atuais ainda depende de uma decisão judicial final.
Se para as crianças que não passaram por um processo de adoção a quarentena tem sido difícil, para os abrigos, o caso não é diferente. “A situação fica mais complicada, elas ficam mais irritadas, é difícil segurar adolescente em casa. E nós não podemos segurar na marra”, lamenta Dias.
Para o juiz, a pandemia também agrava a condição psicológica das crianças e adolescentes nos abrigos. Os espaços também precisaram ser adaptados e os profissionais foram treinados para usar máscara e álcool em gel para evitar a contaminação das crianças. “Eles estão trabalhando com dinâmicas de grupo com as crianças para criar uma consciência coletiva sobre a saúde do grupo”, comenta.
Desmistificando a adoção
– A família de origem é sempre a primeira opção da Justiça e a maioria retorna para sua família biológica;
– Respaldo afetivo: a renda da família que deseja adotar uma criança ou adolescente não é o principal requisito analisado, mas, sim, as condições psicológicas de acolher e criar uma criança;
– 70% das crianças e adolescentes ficam menos de um ano nos abrigos, mas, quando entram na adolescência, as possibilidades de adoção diminuem e eles acabam passando mais tempo lá;
– As adoções frustradas são baixas justamente porque os processos são lentos e cuidadosos, com respaldo técnico e tempo para um espécie de teste para os dois lados. Informações do R7.