Calor aumenta e preço de legumes cai

Foto: Ilustração

Não é apenas uma sensação de calor e de alívio no bolso. A medida que as temperaturas estão mais altas, os preços de muitos alimentos seguem o caminho oposto. Enquanto os ponteiros sobem, as cotações caem, e em alguns casos chegam a despencar. No setor dos hortifruti a redução é quase geral. 

Na Central de Abastecimento de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador, a caixa de dez quilos do pimentão está sendo vendida até por R$ 15, cerca de 40% a menos do que no fim de setembro. Valor bem diferente do segundo trimestre, quando a produção caiu e a caixa do legume chegou a custar R$ 40.

A redução nos preços pode ser observada ainda na abobrinha, repolho, alface americana e maxixe. 

O tomate, que nos últimos seis meses deixou de ser o vilão da prateleira, também continua em plena queda livre. A caixa do fruto agora não passa dos R$ 30, 25% a menos do que no mês anterior e 77% mais barato do que em abril, quando chegou a ser vendido por R$ 130.

Segundo os especialistas, as oscilações dos termômetros influenciam fortemente nos preços.

Na região de Irecê, centro norte da Bahia, os produtores de cebola ficaram vários dias sem colher em outubro por causa do excesso de chuva que impedia a entrada nas plantações. Agora, o intenso calor associado à elevada umidade podem afetar a qualidade das hortaliças no solo. Por isso muitos agricultores devem retirar mais cebolas do campo para evitar perdas. De acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), a cotação na região ficou 19,4% menor nas últimas duas semanas. Direto na plantação o quilo chegou a custar R$ 0,84. O excesso no mercado pode fazer o preço cair ainda mais nas próximas semanas.

PREJUÍZOS NA ROÇA

Já na central de abastecimento de Jaguaquara, centro sul da Bahia, de onde saem cerca de 200 caminhões carregados por dia, as quedas nos preços chegam a 68% em alguns produtos agrícolas.

A caixa com vinte e cinco quilos de chuchu baixou de R$ 25 para R$ 8. Já o repolho está 44% mais barato. A caixa com quinze quilos diminuiu de R$ 18 para R$ 10. 

“Algumas hortaliças, como a alface, caíram tanto de preço que muitos agricultores nem estão colhendo. O gasto com mão-de-obra e frete é maior do que o custo da mercadoria, não cobre e não vale a pena. As lagartas já estão comendo tudo. Tem gente mandando passar o trator para erradicar as plantas e evitar que elas proliferem pragas”, conta o produtor rural Paulo Cézar Bernardino. 

Na mesma região, a caixa com 12 unidades da alface americana caiu de R$ 50 para até R$ 10. Esta semana muitos produtores preferiram até doar os tomates cultivados na região. O tomate de primeira chegou a atingir uma das cotações mais baixas dos últimos anos, cerca de R$ 16 a caixa.

Segundo os analistas de mercado ouvidos pelo CORREIO, o aumento da produtividade, influenciado pela elevação dos termômetros, não é raro nesta fase de transição das estações mais frias para as mais quentes. Ao lado do fatores climáticos, a oferta de hortaliças também cresceu no restante do país e a Bahia vem recebendo muitos produtos enviados por outros estados.

Os produtores de abóbora são outros que amargam prejuízos. O clima favoreceu a produtividade e o legume brotou com intensidade na maior parte do estado. No nordeste da Bahia, entre os municípios de Paripiranga e Adustina, tem agricultor preferindo dar as abóboras para alimentar os animais. Com o quilo custando até R$ 0,15 fica difícil cobrir os custos com colheita e transporte.

As frutas também não estão imunes aos efeitos das altas temperaturas. Na região de Bom Jesus da Lapa, no oeste do estado, são as bananas que vêm apresentando as consequências. Os termômetros alcançaram 37°C semana passada e favoreceram o aparecimento de mais frutos nos pomares.

“As maiores temperaturas acabaram adiantando a colheita da banana prata prevista para o final do ano. Com redução de 8% nas cotações da banana prata de primeira qualidade. Os bananicultores estão comercializando o fruto em média por R$ 1,50 o quilo”, aponta o relatório do Cepea.

Temperatura favoreceu produção de hortaliças na região de Jaguaquara, mas excesso do produto está provocando queda de preços e tem agricultor deixando até de colher. (Foto: Paulo Bernardino)

ALHO SEM PROTEÇÃO

Ao contrário da maioria dos alimentos, o alho subiu de preço nas últimas semanas. Na Ceasa de Simões Filho, região metropolitana de Salvador, o produto está 12,5% mais caro do que em setembro. A caixa com dez quilos que estava sendo vendida por R$ 160 agora sai por R$ 180.

Mas neste caso não é a temperatura que pesa na balança. As cotações estão sujeitas às variações do mercado internacional, e pode voltar a cair rapidamente pois depende dos chineses. 

Tem sido assim desde que este ingrediente básico da culinária brasileira passou a ser importado de outros países, e se tornou um dos principais temas de discussão entre o Brasil e a China. 

Tudo começou há vinte e cinco anos, quando o governo brasileiro decidiu permitir a entrada do alho chinês para abastecer o mercado interno. A situação começou a ficar crítica quando o alho do país asiático passou a chegar ao Brasil bem mais barato do que o alho cultivado pelos produtores nacionais, cerca de R$ 25 a menos.

Por causa do impasse, mais de 500 produtores brasileiros desistiram do plantio de alho nos últimos anos. Os agricultores daqui alegam que a alta carga tributária e os custos internos de produção impedem a redução dos preços.

Em 1994 os chineses passaram a ser acusados de dumping, estratégia em que um país fornece produtos com valor abaixo de mercado para quebrar a concorrência local e dominar o comércio.

Para tentar equilibrar a balança o governo brasileiro decidiu impor ao alho chinês uma tarifa antidumping. Desde então, as empresas importadoras são obrigadas a pagar US$ 0,78 por quilo de alho fresco ou refrigerado que entra no país. 

Alho do Brasil sofre forte concorrência da produção chinesa. Cerca de 57% do mercado brasileiro é abastecido por outros países.(Foto: divulgação)

A alíquota vem sendo cobrada desde 1995 e em outubro deste ano foi prorrogada por mais cinco anos. O Ministério da Economia entendeu que a extinção da tarifa prejudicaria a indústria nacional.

“Sem a renovação da tarifa antidumping a cultura do alho no Brasil acabaria. O produtor brasileiro não consegue competir diante de uma concorrência extremamente desleal”, afirma Rafael Jorge Corsino, presidente da Associação Nacional de Produtores de Alho.

De acordo com a ANAPA, o Brasil consome cerca de 30 milhões de caixas de alho por ano. Cada caixa tem 10 kg. Os agricultores brasileiros produzem 13 milhões de caixas, cerca de 43% do volume consumido pelo mercado interno. 

Os chineses sozinhos fornecem 20% do alho vendido no Brasil, ou seja, cerca de 6 milhões de caixas de 10 kg por ano. As outras 11 milhões de caixas vêm de diversos países, entre eles a Argentina, que não paga tarifa por causa do acordo do Mercosul, e a Espanha, que paga 35% de imposto.

Ainda segundo a ANAPA, quando se retira o imposto, as empresas importadoras compram o alho chinês por R$ 50 a caixa. Já o custo de produção do alho nacional é de R$ 75 a caixa. 

“Isso expulsa os produtores brasileiros da atividade. Nos últimos dois anos, quando algumas importadoras entraram com liminares para não pagar a tarifa antidumping, deixamos de gerar aproximadamente 10 mil empregos e o Brasil deixou de arrecadar cerca de 160 milhões de reais”, completa Corsino. 

Presidente da Associação Nacional dos Produtores de Alho, Rafael Jorge Corsino, quer mais proteção para o alho brasileiro. (Foto: ANAPA)

Na Bahia a produção de alho caiu drasticamente nos últimos anos. Em 2018 o estado produziu 6.300 toneladas, o equivalente a 4,64% da produção nacional. A maior parte dos alhicultores está concentrada nos municípios de Novo Horizonte, Cristópolis, Ituaçu, Mucugê e Ibicoara. 

Os agricultores do Agropolo, que já chegaram a cultivar 1.100 hectares com alho na Chapada Diamantina, viram toda a produção migrar para o estado de Goiás, que concede benefícios tributários para o cultivo. Os produtores de lá são isentos da alíquota do ICMS na venda para outros estados.

“Esta região da Bahia tem grande potencial para o cultivo do alho nobre, que é maior e mais valorizado que o alho comum. No entanto, por questões tributárias, a Bahia perdeu milhares de empregos ligados a este sistema de produção”, afirma Evilásio Fraga, coordenador do Agropolo da Chapada.

A cadeia produtiva do alho costuma gerar muitos empregos porque todas as fases do processo são manuais, do plantio à colheita. Cada hectare cultivado é capaz de gerar no mínimo cinco vagas de trabalho.

A Bahia ocupa atualmente a quinta posição no ranking nacional de produtores de alho. A maior parte da produção é mantida por agricultores familiares nos municípios de Novo Horizonte e Cristópolis. Nestes municípios cada produtor ocupa em média um hectare. Informações do Jornal Correio.