Milhares de trabalhadores da Ford estão reunidos na sede da montadora, em Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador, na manhã desta terça-feira (12). Eles protestam pelo fechamento das fábrica em todo país, anunciadas pela marca nessa segunda (11).
Antes das 6h eles já estavam reunidos ao redor de um mini trio elétrico estacionado na garagem da empresa em Camaçari. Lá, representantes dos sindicatos discursam. A garagem está cheia de funcionários vestidos com uma farda azul, da cor da empresa. Todos usam máscaras e se reúnem em grupos de quatro a cinco pessoas, tentando manter um distanciamento. No momento de chuva mais forte, por volta de 6h30, os manifestantes precisaram se aglomerar embaixo de toldos.
Segundo Julio Bonfim, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Camaçari, são 8 mil trabalhadores diretos afetados e, com as empresas de auto-peças, o número pode chegar a 12 mil. Já a Ford foi mais modesta nos números: disse que apenas 5 mil trabalhadores serão demitidos em toda América do Sul. “Os trabalhadores rodoviários vão ficar sem emprego. O pessoal da limpeza da vigilância, do lanche vão ficar sem emprego. E a Ford tem a cara de pau de dizer que só são cinco mil trabalhadores afetados para amenizar a carnificina que está sendo feita”, disse Bonfim.
Bonfim comparou a situação a um funeral. “A ficha ainda não caiu. É como se fosse um parente nosso que morreu. A Ford não tem mais interesse no pais. É um problema do país. Nós vamos tentar negociar, mas vai ser muito difícil. O governador também tem que fazer o máximo para manter os nossos empregos. Não dá só para falar que tá negociando com a China. Esse é um discurso paliativo. É preciso uma ação mais forte. Essa decisão vai ter um impacto econômico forte no PIB da região metropolitana e de camaçari”, concluiu.
Reestruturação
Se aqui na Bahia o fechamento do complexo em Camacari põe fim a 20 anos de história, nacionalmente, a Ford interrompe uma trajetória de um século. Em 1919, a montadora norte-americana inaugurava no centro de São Paulo uma fábrica para a produção do icônico Ford T, carinhosamente chamado pelos brasileiros de Bigode.
No comunicado divulgado à imprensa, a Ford fez questão de ressaltar que vai parar de produzir no Brasil, mas continuará no mercado nacional, importando veículos como a nova picape Ranger, a Transit e outros modelos, além dos planos de lançar diversos novos veículos conectados e eletrificados. A empresa destacou que a pandemia de covid-19 ampliou a capacidade ociosa de suas fábricas e a queda nas vendas, que já persistia por alguns anos.
“A Ford está presente há mais de um século na América do Sul e no Brasil e sabemos que essas são ações muito difíceis, mas necessárias, para a criação de um negócio saudável e sustentável”, disse Jim Farley, presidente e CEO da empresa. “Estamos mudando para um modelo de negócios ágil e enxuto ao encerrar a produção no Brasil, atendendo nossos consumidores com alguns dos produtos mais empolgantes do nosso portfólio global”, disse o executivo.
Segundo o comunicado, a empresa “irá trabalhar imediatamente em estreita colaboração com os sindicatos e outros parceiros no desenvolvimento de um plano justo e equilibrado para minimizar os impactos do encerramento da produção”. Jim Farley destacou que a empresa fez o que podia para manter a produção no Brasil. “Além de reduzir custos em todos os aspectos do negócio, lançamos, na região, a Ranger Storm, o Territory e o Escape, e introduzimos serviços inovadores para nossos clientes”, disse. “Esses esforços melhoraram os resultados nos últimos quatro trimestres, entretanto a continuidade do ambiente econômico desfavorável e a pressão adicional causada pela pandemia deixaram claro que era necessário muito mais para criar um futuro sustentável e lucrativo, lamentou.
Cenário econômico
Em um comunicado enviado para a sua rede de concessionárias, a empresa falou sobre as dificuldades no cenário econômico brasileiro. O presidente da Ford na América do Sul, Lyle Watters, ressaltou que as dificuldades vinham sendo enfrentadas desde 2013. “Desde a crise econômica em 2013, a Ford América do Sul acumulou perdas significativas e nossa matriz tem auxiliado nossas necessidades de caixa, o que não é mais sustentável”, contou.
Este cenário teria sido agravado pela situação cambial atual e pela pandemia do novo coronavírus. “A recente desvalorização das moedas na região aumentou os custos industriais além de níveis recuperáveis e a pandemia global ampliou os desafios, gerando uma capacidade ociosa ainda maior, com redução nas vendas de veículos na América do Sul, especialmente no Brasil”, destacou.
Segundo Lyle Watters, a Ford teria tentado manter as unidades de produção em funcionamento de todas as maneiras possíveis. “Essa decisão foi tomada somente após perseguirmos intensamente parcerias e a venda de ativos. Não houve opções viáveis”, ressaltou. Informações do Correio.