Dupla Ba-Vi vê como positiva mudança nos direitos de transmissão; especialista aponta riscos

Foto: Felipe Oliveira / Divulgação E.C Bahia

Com pouca bola rolando por gramados brasileiros, temas extracampo ganharam mais força durante a pandemia do novo coronavírus. Entre esses assuntos está a Medida Provisória (MP) 984, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro em junho. A MP do Futebol, como tem sido chamada, transfere ao mandante da partida o direito de transmissão daquele evento.

A MP 984, como todas as outras, não é uma decisão definitiva até que seja aprovada no Congresso Nacional. Ela é válida inicialmente por 60 dias, com possibilidade de ser prorrogada por mais 60.

Até então, a legislação previa que a transmissão só era possível quando havia acordo entre os dois clubes envolvidos no jogo em questão. Ou seja, uma emissora ou canal de streaming teria que comprar os direitos televisivos de mandante e visitante.

Na nova dinâmica, cada clube fica livre para negociar seus jogos em casa ou até transmiti-los por conta própria. Para Amir Somoggi, sócio-diretor da Sports Value e especialista em marketing esportivo, a mudança é boa, mas acontece de forma perigosa para o clubes.

“É algo positivo, o problema é a forma que foi encontrada para alcançar isso. Então, a vantagem é poder falar sobre isso, e a desvantagem é a forma, no meio de uma guerra entre governo e Globo, não é o ideal. Isso pode até afetar todas as outras questões, e os clubes podem acabar perdendo dinheiro”, disse Somoggi, que alertou também para a chance de se criar um abismo ainda maior entre clubes no futebol brasileiro.

“Sim, os clubes com maior potencial podem se distanciar cada vez mais dos clubes menores, que vão ficando para trás até por ter menos estrutura”.

Somoggi tocou em outro ponto importante, ao afirmar que as equipes brasileiras ainda não estão prontas para lucrar com seus produtos em plataformas online, caminho apontado por muitos como o futuro das transmissões esportivas.

“Nenhum clube está preparado para explorar comercialmente seus jogos. Hoje os clubes brasileiros mal sabem monetizar suas redes sociais. Eles estão dando receita para YouTube, Facebook, Instagram, ao invés de ganharem receita com seus conteúdos. Por isso entendo que seja um passo muito arriscado, e que alguns clubes ainda vão sofrer muito por perda de receita de televisão daqui para a frente”, pontuou.

Clubes

Guilherme Bellintani e Paulo Carneiro, presidentes de Bahia e Vitória, respectivamente, foram mais otimistas em relação à MP. O mandatário tricolor usou as redes sociais para celebrar a “impressionante oportunidade de mudança”, e o rubro-negro afirmou que “Os clubes estão prontos, o resultado disso tem tudo para ser bom. Os clubes precisam aproveitar”.

Ambos, no entanto, defenderam que a MP precisa vir acompanhada de negociações coletivas entre os clubes. Os mandatários entendem que, para conseguir lucrar, os times precisam montar blocos e vender, juntos, os jogos para um mesmo comprador.

“A proposta como ponto de partida é excepcional, mas ela, sozinha, não se sustenta. Ela precisa de negociação coletiva acoplada ao direito do mandante. Sem a negociação coletiva, o caminho é o da disparidade, que é como acontece em Portugal, onde a diferença de Benfica, Porto e Sporting para os outros é de 1.500%. Lá tem direito do mandante, mas não tem negociação coletiva. A negociação em bloco é a chave para isso aí. Quanto mais você negociar em bloco, mais poder você tem”, alertou Paulo Carneiro, que usou clubes do Nordeste como exemplo de um desses blocos.

“Se quatro clubes do Nordeste estiverem na primeira divisão, eles podem juntar seus 19 jogos e cada um alcançar 76 partidas. Só aí você percebe o nível do empoderamento que a MP oferece aos clubes”.

Bellintani, por sua vez, comentou sobre as primeiras implicações já geradas pela Medida Provisória. Depois que ela foi editada por Bolsonaro, o Flamengo, que não tinha vendido seus direitos televisivos referentes ao Campeonato Carioca, usou o YouTube para transmitir um jogo em que foi mandante contra a Portuguesa, equipe essa que tinha acordo com a TV Globo. No dia seguinte, a emissora rescindiu o contrato de transmissão do Carioca.

“A chance é única. Um Brasileirão de nove meses com pré-temporada de 40 dias deixaria tudo melhor. E eu troco fácil um título estadual por três pontos a mais no Brasileirão. Clubes nacionais nunca serão mundiais jogando estaduais”, disse o cartola tricolor, em defesa de um novo calendário que pode surgir a partir de reflexos da nova MP.

Apesar da medida provisória já ter recebido apoio de boa parte dos clubes, há também quem se mostre com um pé atrás em relação à proposta. É o caso do presidente do Grêmio, Romildo Bolzan.

“Da maneira que foi encaminhada, me parece que a demanda atendeu a interesse específico. É um ato muito pequeno e de enorme problema, enorme consequência, que pode ser boa ou ruim. O cerne de tudo está na forma como foi encaminhado: completamente sem debate prévio. Tudo foi encaminhado de maneira solitária, por um clube, sem a mínima preocupação de debate”, disse o mandatário, em entrevista à Rádio Guaíba. Informações do Portal A Tarde.