A família de Maria da Conceição Ferreira da Silva, de 68 anos, moradora do bairro do Parque Verde I, procurou a nossa reportagem para denunciar o que eles chamaram de negligência por parte da Secretaria de Saúde de Camaçari (Sesau). De acordo com dados da própria Sesau, a idosa foi a terceira pessoa a morrer em Camaçari por causa da Covid 19.
Segundo familiares, Maria foi levada a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) naquele bairro, várias vezes desde o último dia 27 de abril, com sintomas suspeitos. De acordo com a filha de dona Maria, todas as vezes em que foi levada à unidade de saúde, a idosa foi medicada e mandada de volta para casa: “desde o dia vinte e sete (de abril) ela estava indo e voltando para a UPA, e disseram que era uma virose”.
Ela informou ainda que pediu ao médico que fizesse o teste para saber se sua mãe estava infectada ou não com o novo Coronavírus. Mas segundo ela, o médico teria dito que naquela unidade não era possível fazer o teste, apenas internamento, o que não era o caso: “desde o início eu dizia: oh, doutor, faz o exame de Coronavírus, e ele disse: aqui não faz, só faz internar. O caso dela não é de internamento”.
A última vez que dona Maria foi levada à UPA, a família foi informada que ela seria internada, devido a um quadro de pneumonia: “no dia três de maio, eu levei ela para a UPA, e eles disseram: a senhora vai ser internada e já está com pneumonia”, contou a filha.
“No dia três, eles fizeram o teste, aí no domingo à noite mesmo, ela foi transferida para o Centro de Enfrentamento (que abriu agora) desse vírus, e às 14h (do outro dia) ela faleceu”, completou.
Dona Maria teve contato com várias pessoas antes de ser internada
Antes de ser internada pela última vez, a idosa teve contato com pelo menos doze pessoas da família durante oito dias, e após a morte de dona Maria, uma das netas apresentou sintomas: “eu solicitei, pedi para fazer o teste; ontem mesmo, a minha filha estava com dor de cabeça e dor no corpo, a gente não sabe, por que gente teve contato direto meso com ela”, declarou.
“Ninguém atende”
Apesar de apresentar sintomas suspeitos da covid-19, a menina não foi levada a uma unidade de saúde. A filha conta que o pessoal do Centro de Enfrentamento da Covid-19 passou um número de telefone para contato, mas quando ela liga, nunca atendem: “então ela me deu um número, e quando a gente liga, só faz chamar, chamar, chamar e ninguém atende”.
A notícia da morte
A notícia sobre o estado de saúde da idosa seria dado por telefone. Às seis horas do dia 04/05, depois de ter ido mais cedo ao Centro de Enfrentamento ao Coronavírus de Monte Gordo, a filha recebeu a ligação informando sobre a morte da dona Maria:” e quando deu seis horas eles disseram: traz o documento da sua mãe, aqui no hospital”.
E contou que foi orientada pelo médico sobre o limite de pessoas no velório: “ele disse: (…) sua mãe morreu de insuficiência respiratória (…) você sabe que não pode ter velório, só pode ir dez pessoas. Eu entendi, porque estava prevenindo as outras pessoas que ficaram”.
“A gente não viu nada”
Segundo ela, após receber a notícia, se dirigiu a uma funerária do centro da cidade, onde foi resolver os trâmites do sepultamento, e o enterro ficou marcado para a tarde do dia seguinte.
A família conta que quando deveria acontecer o sepultamento, ao chegar no cemitério, não viu o enterro da idosa: “quando a gente chegou no cemitério, não viu o enterro da minha mãe, a gente não viu nada, nada”.
“Para mim, a minha mãe, ou está no hospital ainda, ou ela foi enterrada como indigente, porque ninguém entrou em contato com a gente”, sugeriu.
Sete pessoas estiveram no cemitério, entre amigos e familiares, e quando estavam chegando, os agentes funerários já estavam deixando o local. O que espantou a família: “eu perguntei de quem era o enterro. Eles responderam que foi de uma senhora que havia morrido de Coronavírus. Perguntei se foi Maria da Conceição Ferreira da Silva, eles disseram que sim, pois não podiam esperar”
A última vez que ela viu a mãe
O último contato da filha com dona Maria foi na noite de domingo, quando ela se despediu da mãe antes de sair, para voltar no outro dia: “no domingo à noite eu conversei com ela, ela estava falando, estava conversando. Aí eu disse: olha, minha mãe, eu vou em casa, daqui a pouco”.
Na mesma noite, a neta da idosa ligou para casa avisando que a avó havia sido transferida para Monte Gordo.
“Ninguém deu assistência à gente”
A filha reclama de falta de assistência da Sesau. E diz que não foi recomendada nenhuma medida de isolamento, já que uma pessoa apresentou sintomas na casa: “só disseram que a gente ficasse em casa, em quarentena, e qualquer dúvida, ligasse, só isso. Mas ninguém deu assistência à gente para saber se a gente estava precisando de alguma coisa”.
Ela acredita que a mãe pode ter sido enterrada como indigente por não ter assinado nenhum papel: “para mim ela está como indigente, porque eu não assinei papel, eu não vi em cemitério, em nada”.