Mais de 250 famílias correm o risco de serem despejadas da ocupação Recanto da Vitória, em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador. Uma decisão liminar concedida pela 5ª Vara Cível da capital baiana determinou a reintegração de posse do terreno aos supostos proprietários.
A ocupação começou ainda durante a pandemia, há um ano e três meses, e está localizada nas imediações da estrada CIA/Aeroporto. “Na maioria, são pessoas negras que perderam os empregos neste período de pandemia ou tiveram redução de renda e deixaram de ter como pagar os aluguéis”, afirma o dirigente do Coletivo Entidades Negras (CEN), Thiago Carvalho.
Segundo ele, as famílias vivem em barracos construídos de pallets, sem qualquer tipo de saneamento, e que, devido ao processo de reintegração de posse, o sentimento no local é de medo constante.
“Os moradores relatam que passam viaturas da PM com alguma frequência, o que gera um clima de tensão entre eles por não saber se estão indo fazer a retirada das pessoas da comunidade”, diz o representante da entidade, que está prestando apoio aos moradores.
De acordo com Luiz Paulo Bastos, advogado do CEN que está acompanhando a ação, a liminar deferida deixou de observar requisitos estabelecidos pelo Código de Processo Civil como, por exemplo, a prova acerca da data da ocupação irregular. “Por se tratar de uma posse velha, que data de mais de ano e dia, o juiz não poderia conceder medida liminar, sem antes designar audiência de mediação, citando os réus para o devido comparecimento”, explica ele.
Outro ponto é que a liminar deixa de observar a decisão do STF na ADPF N° 828 e a Recomendação N° 90 do CNJ, que orientam que, durante a pandemia, não ocorram reintegrações de posse, despejos ou outros atos que impliquem na retirada coletiva de pessoas, principalmente em situação de vulnerabilidade, dos locais em que constituíram habitação.
Conforme Luiz, a liminar foi concedida no dia 8 de abril e se encontra pendente de cumprimento, podendo ser executada a qualquer tempo, caso a decisão não seja reconsiderada ou reformada pela justiça.
Resistência
Com o objetivo de chamar atenção da sociedade e do poder público para o problema, o CEN realiza neste sábado, 3, a partir das 8h, o mutirão “Ocupa Recanto da Vitória”. “A ideia é cadastrar as famílias para a gente ter uma noção mais precisa do perfil da comunidade. Nós temos dialogado com eles, mas queremos ter informações mais precisas até para poder nos auxiliar a dialogar com o poder público”, explica Thiago.
Veja o que diz a publicação no Instagram:
“A Ocupação Recanto da Vitória, em Lauro de Freitas (Grande Salvador), tem resistido firme, mesmo diante da injusta decisão liminar concedida pela 5ª Vara Cível da capital baiana, que determina a reintegração de posse do terreno onde habitam mais de 250 famílias que não têm alternativa de moradia.
A liminar da Justiça da Bahia ignora o momento pandêmico e a dor de mais de duas centenas de famílias, incluindo idosos, mulheres e crianças que, por causa da crise econômica e sanitária, estão ainda mais empobrecidos, perderam empregos e passam dificuldades até mesmo alimentares.
A liminar também desobedece determinação da Suprema Corte do Poder Judiciário do Brasil e uma Recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que garante a permanência de ocupações existentes a mais de um ano ou que surgiram antes da pandemia da Covid-19. Mas a luta pela vida, pela dignidade e por direitos básicos vencerão a batalha contra uma arbitrariedade absurda cometida pelo Judiciário baiano!
Estamos do lado da legalidade, amparados pelo STF e CNJ!
Qualquer tentativa de despejo dessas 250 famílias de trabalhadoras e trabalhadores é desumana e flagrantemente ilegal! O mandado de reintegração de posse emitido pela Justiça da Bahia é acompanhado de pedido de reforço policial à PMBA – o que cria tensão no seio das famílias.
Mas não recuaremos! No sábado, dia 3, seguiremos organizando a luta, promovendo formação política, atividades culturais e ações de solidariedade. Será uma série de atividades, o MUTIRÃO OCUPA RECANTO DA VITÓRIA, mas também iremos para as ruas lutar por vacina no braço, comida no prato e Fora Bolsonaro.
A crise brasileira, com desemprego recorde e o retorno da fome, é o principal motivo que leva essas famílias, composta de negros e negras, a não ter onde morar, tendo que criar seus filhos e se desenvolver à margem de qualquer conceito de dignidade.
O Brasil não pode continuar sendo o país com mais imóveis fechados, sem função social, do que famílias sem moradia e o segundo com maior concentração de renda.
O CEN e o MTST estarão com as famílias da ocupação até o final. Porque morar é um direito e por ele lutaremos! Só a luta muda a vida!
Fotos Jonas Santos“
A equipe do Portal A TARDE não conseguiu contato com os proprietários do terreno até a publicação desta reportagem.
Fonte: Portal A Tarde.