“Na vida, a Bíblia; no STF, a Constituição”, diz André Mendonça

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Durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, na manhã desta quarta-feira (1º/12), o ex-ministro André Mendonça, que é evangélico, afirmou aos senadores estar comprometido com o Estado laico.

“Me comprometo com o Estado laico. Considerando discussões havidas em função de minha condição religiosa, faz-se importante ressaltar a minha defesa do Estado laico”, disse em sua primeira fala. “Na vida, a Bíblia; no STF, a Constituição”.

“Ainda que eu seja genuinamente evangélico, não há espaço para manifestação pública-religiosa durante as sessões do Supremo Tribunal Federal”, continuou.

O ex-advogado-geral da União é o indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, em vaga aberta com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello.

A apreciação do nome indicado por Bolsonaro ocorre após pouco mais de quatro meses de espera e quedas de braço entre governistas, membros da CCJ e o presidente do colegiado, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Pessoalmente contra a indicação de Mendonça, o senador amapaense tentava travar a realização da sabatina desde 13 de julho, quando o presidente da República divulgou o desejo de ver o advogado “terrivelmente evangélico” sentado na cadeira de ministro da Suprema Corte.

O ex-presidente do Senado nunca escondeu seu desapreço pelo nome escolhido por Bolsonaro. Se dependesse do senador amapaense, o procurador-geral da República, Augusto Aras, é quem deveria estar sendo sabatinado nesta manhã. A indicação de Mendonça, no entanto, partiu da promessa feita por Bolsonaro a eleitores de que indicaria um ministro evangélico ao STF.

A demora para marcar a sabatina surtiu efeito oposto ao desejado por Alcolumbre, que passou a ser publicamente cobrado nas sessões da CCJ pelos membros da comissão. Outro fator a pesar contra o senador foi a decisão do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de comunicar aos senadores a realização de uma semana de esforço concentrado para destravar as sabatinas.

A “força-tarefa”, marcada para ocorrer entre os dias 30 de novembro e 2 de dezembro, visa justamente destravar e dar celeridade às sabatinas que foram engavetadas com a suspensão das atividades da comissão mais importante da Casa, em razão das restrições impostas pela pandemia. Estima-se que 48 nomes indicados a cargos públicos ainda aguardam serem sabatinados no Senado.

Relatório

A indicação de André Mendonça para vaga de ministro do STF será relatada na CCJ pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA).

No relatório, ao qual o Metrópoles teve acesso, a parlamentar, que é evangélica, afirma que pelo fato de Mendonça ser descrito como “terrivelmente evangélico” recaem sobre o indicado “grandes responsabilidades e compromissos para com o Estado laico e a democracia”.

“Temas que serão o centro da inquirição que faremos, a qual tende a ser histórica. Um momento importante para afirmar princípios republicanos e também para superar preconceitos, muitos deles artificiais e reforçados por falas enviesadas do próprio presidente da República”, defendeu a senadora no texto.

A senadora do Cidadania também defende, no relatório, que André Mendonça “honrou a administração pública como servidor dedicado e diligente, e constata-se o seu notório saber jurídico e reputação ilibada, atendendo aos requisitos constitucionais previstos”.

Estratégia

Impossibilitado de manter o nome do advogado “na geladeira”, Alcolumbre passou a trabalhar nos bastidores para ampliar a rejeição do ex-ministro de Bolsonaro na CCJ e no plenário. O esforço, no entanto, não deverá surtir efeito na comissão.

Consulta do Metrópoles a membros do colegiado aponta que o ex-AGU provavelmente conseguirá os 14 votos necessários para aprovação. Em plenário, o advogado terá de conquistar o apoio de 41 dos 81 parlamentares. Hoje, Alcolumbre calcula que Mendonça receberá entre 47 e 50 votos contrários, o que inviabilizaria sua condução ao STF.

A resistência de Davi Alcolumbre para pautar a sabatina do ex-ministro de Bolsonaro decorre de uma questão pessoal, o que levou alguns senadores que se manifestavam nos bastidores contra a indicação a reavaliar o posicionamento, mas não necessariamente a mudar de posição.

Senadores e auxiliares relatam que a estratégia de Alcolumbre para segurar ao máximo a sabatina de Mendonça surtiu efeito contrário ao desejado pelo amapaense. Se a vontade do ex-presidente do Senado era ampliar a rejeição dos colegas parlamentares ao evangélico, o cenário, hoje, é o oposto. Senadores que votariam contra a indicação em um primeiro momento, agora, se mostram mais flexíveis ao nome sabatinado.

Parlamentares avaliam que, ao comprar briga com o governo recusando-se a pautar a sabatina, Alcolumbre entrou na mira de governistas que, antes, torciam o nariz para Mendonça. O panorama é de que há senadores que votarão a favor do ex-AGU apenas para “derrotar” o senador do DEM.

Perfil

Natural de Santos (SP), André Mendonça é advogado da União desde 2000, foi assessor especial do ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, de 2016 a 2018, e ministro da Justiça e Segurança Pública, de 2020 a 2021. Está em sua segunda passagem pelo cargo de advogado-geral da União na gestão de Bolsonaro.

O presidente Bolsonaro havia firmado compromisso de designar alguém “terrivelmente evangélico” para a Corte. Mendonça é bacharel em teologia, pastor e frequentador da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília. Integrantes da bancada evangélica no Congresso davam como certa a indicação.

Segundo Bolsonaro, ele é “uma pessoa que vai nos orgulhar”. “E não tem negociação desse cargo. A indicação, pela Constituição, pertence ao presidente da República. E ele vai defender o Brasil dentro do Supremo Tribunal Federal”. Informações do Portal Metrópoles.