Procurador-geral da BA diz que contrato analisado para compra de respiradores é diferente do assinado: ‘Erro grave’

Foto: Carol Garcia/GOVBA

O procurador-geral da Bahia, Paulo Moreno, disse que o contrato analisado para compra dos respiradores do Consórcio Nordeste é diferente do que foi repassado para ser assinado pelo governo.

Segundo Moreno, o contrato analisado previa a garantia de execução e entrega dos equipamentos, mas o documento teria sido modificado depois da análise dos procuradores.

“Houve uma inconformidade entre a análise que nós fizemos e o contrato que foi assinado, o que motivou que o governador imediatamente adotasse uma medida voltada a um processo de sindicância para exatamente esclarecer este ponto: o contrato que chegou lá com o contrato que havia inconformidades com o que nós analisamos pela PGE”, disse o procurador.

“Basicamente, a gente identificou a questão da garantia da execução. Essa garantia da execução ela não constou no contrato. Então é um erro grave” – Paulo Moreno, PGE.

Com a abertura da sindicância, a Procuradoria Geral do Estado da Bahia vai poder responder o que permitiu a contratação da empresa Hempcare.

O superintendente técnico do Tribunal de Contas do Estado, José Raimundo, disse que o contrato assinado não prevê garantias de cumprimento.

“Não houve nenhum tipo garantia induzida para o cumprimento. Poderiam, por exemplo, fazer um seguro bancário. Lógico, isso aumentaria o custo do respirador e também diminuiria o lucro do fornecedor, mas a compra do respirador com nenhum tipo de garantia, nós consideramos que foi um procedimento de risco muito elevado, para ser feito pelo estado em grandes quantidades”, avaliou ele.

Ex-secretário assume descumprimento

Investigação: Bruno Dauster fala pela primeira vez sobre compra dos respiradores
Investigação: Bruno Dauster fala pela primeira vez sobre compra dos respiradores

Em entrevista à TV Bahia nesta quarta-feira (17), o ex-secretário da Casa Civil, Bruno Dauster, admitiu que diversos procedimentos obrigatórios, que são feitos para resguardar contratos públicos, não foram cumpridos na condução dos contratos dos respiradores. [Veja vídeo acima]

“Você tinha empresas que não tinham uma tradição, mas que tinham equipamentos e que vendiam. Tanto que eles chegaram em alguns lugares ocasionalmente. Esse procedimento foi o único possível. Foi um procedimento que identificamos como viável naquele momento que era absolutamente fora do normal para que, no prazo necessário, a gente desse o volume de equipamentos necessários”, disse Bruno.

Dauster atribuiu o descumprimento em razão da urgência da pandemia. Ele também nega que tenha recebido qualquer valor para intermediar as negociações.

“Nós tínhamos condições de prazos razoáveis e de acordo com a nossa necessidade, através de intermediários. Nós confiávamos e isso é, reconheço, questionável, que as pessoas estavam agindo de forma correta como nós estávamos e que em uma situação de pandemia, as propostas que seriam feitas seriam todas reais. Claro que, sempre que a gente percebesse qualquer problema contra a nossa ideia, era interrompido o processo de compra e resolver a questão imediatamente”, explicou Dauster.

O ex-secretário foi apontado pela dona da empresa Hempcare, Cristiana Prestes Taddeo, como a pessoa com quem ela fez as tratativas do contrato. Ela disse que o secretário teria autorizado a compra dos respiradores nacionais, depois dos respiradores chineses terem apresentado problemas em outros estados.

“Nunca conheci, não tivemos nenhuma relação comercial com esse empresário durante todo o processo de compra. Em verdade, eu estou processando o Paulo de Tarso por calúnia, por ele ter afirmado, inclusive, através da TV Bahia, de que eu recebi dinheiro disso. Eu nunca recebi dinheiro nem de nenhuma das transações comerciais ou de projetos especiais que eu tenha participado”, relatou Dauster.

Caso

Respirador de UTI — Foto: Divulgação/Prefeitura de Santos
Respirador de UTI — Foto: Divulgação/Prefeitura de Santos

A Justiça já havia determinado o bloqueio dos bens da empresa Hempcare, que deixou de entregar os respiradores comprados por R$ 48,7 milhões aos estados nordestinos. A decisão ocorreu após uma ação aberta pelo Consórcio.

No Diário Oficial do Estado da última sexta-feira (29), representando o Consórcio Nordeste, o governador do estado, Rui Costa instaurou processo administrativo com a finalidade de apurar irregularidades praticadas pela empresa Hempcare, com sede em São Paulo.

No documento, consta a informação de que a empresa foi contratada pelo Consórcio Nordeste em 8 de abril de 2020, e que inquérito foi aberto por haver indícios de descumprimento das obrigações contratuais, mediante a inexecução contratual. Os indícios de irregularidades não foram detalhados no documento.

A empresa declarou que não iria recorrer da decisão porque já havia acordado a devolução do dinheiro, que será feita nos próximos dias. Depois disso, os bens deverão ser desbloqueados.

O atraso na entrega da carga dos respiradores foi anunciado no dia 5 de maio, pelo secretário de saúde da Bahia, Fábio Vilas Boas. Na ocasião, havia uma previsão da chegada dos equipamentos ainda no mês de maio, o que não ocorreu.

Dois dias depois, em 7 de maio, o governador Rui Costa informou sobre o cancelamento da compra dos respiradores por causa do atraso. Ainda no início de maio, o secretário Fábio Vilas Boas previa a devolução do dinheiro da compra cancelada dos respiradores até a primeira quinzena do mês.

Diante do insucesso na compra e do processo para devolução do dinheiro investido, o Ministério Público do Estado (MP-BA) abriu um procedimento para apurar possíveis irregularidades nas compras dos respiradores.

Operação Ragnarok

Polícia Civil da Bahia faz operação contra empresa que deixou de entregar respiradores a estados do Nordeste — Foto: Adriana Oliveira/TV Bahia
Polícia Civil da Bahia faz operação contra empresa que deixou de entregar respiradores a estados do Nordeste — Foto: Adriana Oliveira/TV Bahia

A Operação Ragnarok, realizada pela Polícia Civil da Bahia, realizou buscas na empresa Biogeoenergy, que fez parceria com a Hempcare, e no apartamento do diretor da empresa, no bairro do Morumbi, em Araraquara.

O advogado da empresa, Delorges Mano, afirmou que a empresa de Araraquara ainda não começou a produção dos respiradores. Por meio de nota, a Biogeonergy diz que aguarda a certificação da Anvisa para dar início à produção e destaca que não tem contrato de venda assinado com governos.

A dona da Hempcare, que teve os bens bloqueados, informou que fez o contrato para importar respiradores da China, mas que durante as negociações percebeu que os equipamentos fabricados no país apresentavam problemas.

A empresa afirmou que, em contrapartida, ofereceu respiradores produzidos no Brasil, testados pela Anvisa e mais baratos. Ainda segundo a empresa, caso a substituição fosse aceita, ao invés de 300, mais de 400 respiradores seriam entregues.

O secretário de Segurança Pública da Bahia informou que os respiradores nacionais colocados como opção de recebimento pela empresa, nem existem porque não foram homologados pela Anvisa.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que os respiradores produzidos pela Biogeoenergy não possuem registro. Ou seja, não há no órgão nenhum pedido em análise ou qualquer tipo de trâmite. Esse protocolo, conforme explica a Anvisa, é um dos primeiros passos para a certificação de um produto.

Durante a operação, foram detidos o empresário Paulo de Tarso, a dona da Hempcare, Cristiana Prestes, e o sócio dela, Luiz Henrique Ramos. O trio foi liberado no dia 7 junho, após prestar depoimentos. Informações do G1.