Resultado das eleições nos EUA pode demorar semanas para ser definido

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O resultado das eleições presidenciais do Estados Unidos pode não sair por dias, ou mesmo semanas. E, caso isso aconteça, não será a primeira vez. Em 2000, o republicano George W. Bush só foi reconhecido como o vencedor da disputa um mês depois do pleito. O receio agora, 20 anos depois, é de que o drama se repita, e a contagem dos votos para Donald Trump e Joe Biden seja judicializada.

Isso atrasaria a definição e criaria instabilidade no país, já profundamente dividido em uma das mais tensas campanhas eleitorais modernas nos EUA.

Em 2000, a questão girou em torno da votação na Florida. A disputa no país foi tão apertada que o vencedor no estado ficaria com a maioria no colégio eleitoral e, portanto, levaria a Casa Branca. Sucessivas decisões judicias determinavam a recontagem dos votos em alguns condados ou suspendiam as iniciativas.

A questão chegou por fim à Suprema Corte americana, que determinou a anulação da recontagem – e isso sagrou George Bush o vencedor da disputa. Até no tribunal constitucional a votação foi apertada, com cinco juízes pelo fim da recontagem e quatro a favor da sua continuação.

A situação pode se repetir em 2020 caso não haja uma vitória clara de um candidato sobre o outro. “Tudo indica que, se os republicanos não ganharem, quanto menor a distância entre os dois candidatos, mais espaço para a judicialização e mais vai depender da Suprema Corte”, aponta a professora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Rebecca Abers.

FiveThirtyEight

site americano FiveThirtyEight, que agrega pesquisas de intenção de voto e tenta prever os possíveis cenários para a eleição nos Estados-Unidos, calculou uma probabilidade de quatro em 100 de uma recontagem ser solicitada na Justiça. Eles veem essa possibilidade acontecer caso a diferença entre os dois candidatos seja menor do que meio ponto percentual em um estado decisivo.

Neste ano, a polêmica – criada e constantemente pelo presidente Donald Trump sem apresentar qualquer evidência – está nos votos pelo correio. Nos Estados Unidos, é permitido enviar a cédula do voto em vez de fazê-lo presencialmente na urna. Este ano registrou uma quantidade recorde de enviados pelos correios. Já foram mais de 49 milhões – sem contar a votação presencial antecipada, também uma hipótese em muitos estados.

De acordo com Trump, esse tipo de voto é passível de fraude. “As pesquisas sobre isso mostram que [possíveis erros nas contagens de votos pelo correio] tem efeito marginal, porque os EUA têm muita experiência de votos pelo correios”, assinala Abers. Assim, em caso de uma derrota apertada no colégio eleitoral, o discurso para a judicialização já está pronto.

Aposta republicana na Suprema Corte

Essa não foi, entretanto, a única iniciativa do presidente americano nesse sentido. O ponto mais notável foi a substituição a jato da juíza da Suprema Corte Ruth Bader Ginsburg, falecida em 18 de setembro deste ano. Para o lugar dela, o presidente Donald Trump indicou Amy Coney Barret, que já foi aprovado pelo Senado, de maioria republicana, e empossada na segunda-feira (26/10), exatamente uma semana antes do pleito.

“Se tornou muito clara a intenção de encher a corte de juízes que vão ser favoráveis a ele. A preocupação que se tem é que a nova juíza foi colocada pra votar lá a favor do Trump”, explica Abers. Ela lembra que, em fevereiro de 2016, o último ano de governo do ex-presidente Barack Obama, uma vaga abriu na Suprema Corte dos EUA. Faltavam sete meses para as eleições que acabaram elegendo Trump.

Mesmo assim, o Partido Republicano se recusou a aprovar um nome indicado por Obama, alegando que a decisão deveria ficar para o próximo presidente. “Não tiveram nenhuma preocupação com a consistência, foi extremamente contraditório. Eles sentem a possibilidade de perder e não se importam com o que vão fazer para tentar ganhar”, resume a professora da UnB.

Outro ponto de preocupação é que o Partido Republicano já tem acionado o judiciário americano para minar o voto pelo correio. Uma decisão no estado de Iowa determinou que não serão aceito votos que chegarem depois do dia 2 de novembro, mesmo que eles tenham sido enviados dentro do prazo legal. Antes, esses votos eram aceitos.

“No caso de Bush-Gore havia uma sincera dúvida, poderia realmente ser um ou outro, mas em determinado momento a Suprema Corte sustou a recontagem. Isso era uma Suprema Corte claramente definida por linha política”, lembra Abers. “Até aquele momento na história, foi a primeira vez que tinha a Suprema Corte agindo claramente em benefício do partido político que colocou o juiz no lugar.”

Desde então, analisa a professora da UnB, “só aumentou a partidarização da corte, principalmente porque os republicanos colocaram juízes extremamente politizados, como o Brett Kavenaugh”. Ele foi escolhido por Trump para a Suprema Corte em 2018.

Antes disso, ele tinha trabalhado para o Partido Republicano em diversas ocasiões. Em uma delas, ainda como advogado, ele defendeu a campanha de George Bush na ação judicial que suspendeu a recontagem de votos nas eleições de 2000. Agora, no caso de uma situação semelhante ocorrer, ele poderá estar do outro lado do balcão. Informações do Metrópoles.